Maria Berenice Dias[1]
Sensibilizou a todos a história da pequena Sirlei, amplamente divulgada pela imprensa. Ela nasceu prematura e sua mãe morreu no parto. Precisou ficar hospitalizada e está sendo alimentada na Roda de Amamentação do Hospital Conceição. Se não bastasse tudo isso o seu pai – que nem pode chorar a morte da mulher – terá que retornar ao trabalho e deixar a filha aos cuidados de uma vizinha.
Porém nada, absolutamente nada justifica não conceder ao genitor a licença-maternidade. A Constituição Federal assegura licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 dias (CF, art. 7º, inc. XVIII). Tal licença pode inclusive ser prorrogada por mais 60 dias (Lei 11.770/ 2008).
Ainda que seja feita referência seja à gestante, o direito não é um benefício a ela. Trata-se de direito concedido a favor do filho para que receba cuidados especiais no começo de sua vida. Cabe atentar que a própria Constituição consagra o princípio da proteção integral a crianças e adolescentes, assegurando-lhes, com prioridade absoluta, o direito à vida (CF, art. 227).
Ainda que normalmente a licença seja concedida à mãe, quando ela não pode assumir o cuidado do filho – quer porque faleceu, quer por estar incapacitada, ou ainda quando a criança é adotada por um homem, possibilidade que existe na lei – indispensável que o benefício seja concedido a quem exerce as funções de maternagem. Para isso sequer é necessário alteração constitucional ou legal. Basta atentar ao princípio da igualdade. Afinal, mesmo sem mãe, o recém-nascido faz jus aos mesmos cuidados.
Assim, o pai da pequena Sirlei não pode voltar ao trabalho. Diz a reportagem que ele é servidor público, a quem se estendem os mesmos benefícios previdenciários. Obrigá-lo a abandonar a filha afronta um punhado de princípios constitucionais, principalmente o que impõe respeito à dignidade humana. Em prol do melhor interesse da filha, mister que seja assegurado ao seu pai a licença-maternidade.
E, caso lhe seja negado este direito em sede administrativa, que bata ele às portas do Poder Judiciário. Duvido que a justiça do Rio Grande, que se destaca no panorama nacional como a que goza da maior confiabilidade e respeitabilidade, negue a ele tal direito. Afinal, a justiça não é cega e nem pode se insensível!
Publicado em 13/06/2010.
[1] Advogada especializada em Direito das Famílias e Sucessões
Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do RS
Vice-Presidente Nacional do IBDFAM
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