E por que não?

Maria Berenice Dias[1]

 

Não, simplesmente porque não!

Não há como permitir que se faça apologia ao incesto.

Não dá para banalizar o mais hediondo crime praticado contra crianças e adolescentes.

Não é possível admitir que adentre em todos os lares claro apelo de conteúdo erótico dirigido a crianças.

Não se pode violentar os ouvidos de filhos para que cedam à lascívia do seu pai.

Não é admissível que seja divulgada a cantada para minha menina, para ver se ela entra na minha.

Não pode ser outra pessoa que não o pai quem tem o mesmo sangue, quem conhece desde pequena, quem dá o nome.

Não dá para deixar de reconhecer que, quem está apaixonado pelo jeito que a sua menina fala, olha e caminha, tem desejo de ordem sexual.

Não há como não ver que, quem ama as pernas fininhas de sua menina e adora vê-la com suas colegas na escolinha é um pedófilo.

Não ao incesto, não à pedofilia é um compromisso de todos, pois é indispensável assegurar o desenvolvimento sadio dos cidadãos de amanhã.

Não dispõe, quem faz da música meio de comunicar-se com a população, do direito de afrontar os mais elementares princípios éticos e incitar práticas criminosas.

Sim, merece aplauso a iniciativa das entidades de defesa de crianças e adolescentes que, em boa hora, denunciaram ao Ministério Público a banda Bidê ou Balde que gravou a música em sua versão original.

Não é a volta da censura.

Não se trata de afronta à garantia de liberdade de expressão.

Não merece ser chamada de expressão artística flagrante ameaça à dignidade de crianças e adolescentes que merecem, com absoluta prioridade, a especial proteção do Estado.

Assim, nem no bidê nem no balde. Talvez o único lugar que mereça tamanha sordidez seja a lata de lixo. E por que não?

 

 

Publicado em 28/07/2005.

[1] Desembargadora do Tribunal de Justiça do RS

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