Amores plurais

Maria Berenice Dias[1]

 

Há coração de todos os tamanhos e a capacidade de amar é infinita.

Certamente todos já sentiram afeto por mais de uma pessoa. Ama-se pai e mãe; igual é o amor que se dedica aos filhos.

Também se amam irmãos, tios, primos. Além destes, colegas e vizinhos. E de uma maneira muito, muito especial, se ama os amigos.

Não mais se acredita que só se ama uma vez na vida.

Mas quando se fala vínculos afetivos sobrepostos – que sempre existiram – ainda são mal vistos.

Historicamente o casamento era indissolúvel. O amor tinha que ser eterno, mesmo na pobreza, na tristeza e na doença. Esta ideia de infinitude acabou quando as pessoas descobriram que, primeiro, precisam amar a si próprios.

A amante foi chamada de concubina e depois de companheira. Ao invés de concubinato adulterino, passou-se a falar em união paralela ou simultânea.  No máximo vem a justiça deferindo a divisão dos benefícios previdenciários entre esposa e companheira.

Talvez a última barreira que falte romper, seja o reconhecimento de iguais direitos aos amores livres, bela expressão que identifica vínculos afetivos entre mais de duas pessoas, vivendo juntas.  Este fenômeno recebeu o nome de poliamor. A expressão é uma novidade, mas sua existência não.

O fato é que, ao invés de rótulos, da necessidade da chancela estatal, o indispensável é exigir um comportamento ético de todos os atores destes vínculos vivenciais. Sem ser piegas, cabe invocar a máxima do Pequeno Príncipe: a responsabilidade por quem se cativa!

Agora que uniões sem casamento constituem uma família e o divórcio pode ser instantâneo, com facilidade as pessoas migram de um relacionamento a outro. Nesta mobilização levam consigo os filhos, o que faz surgir um caleidoscópio de novos vínculos parentais.

Todos podem amar muitos, mas precisam assumir os ônus decorrentes da confiança que gerou no outro e respectivos filhos. Daí a imposição da paternidade responsável, a primazia da filiação socioafetiva, o reconhecimento judicial da multiparentalidade.

Esta é a única limitação cabível ao amor: a responsabilidade pelos seus afetos em suas múltiplas facetas.

 

Publicado em 22/07/2017.

 

 

 

[1] Advogada

Vice-Presidente Nacional do IBDFAM