ABRAFH e o direito à felicidade
Maria Berenice Dias[1]
Há um sonho sonhado por todos. Não existe nenhuma pessoa no mundo que não almeje, procure e não sonhe com a felicidade.
Apesar de o direito à felicidade ser um direito individual, sempre esteve muito ligado à indispensabilidade de se ter um par. É como diz a música: é improvável, é quase impossível ser feliz sem ter alguém para amar.
Daí a sacralização da família, cantada e decantada por todos os credos e crenças. Todos solenizam o casamento, amarrando um no outro, de forma tão definitiva, que é invocada a chancela divina para lacrar a união.
A naturalização da ideia de que a família deve ser formada por pessoas de sexos diferentes, decorre do dever imposto ao casal de se multiplicar. Isto porque filhos aumentam o número de fiéis da religião dos pais.
O Estado, historicamente refém de ideologias religiosas, copiou o mesmo modelo de família, e sempre houve interesse no aumento populacional: antes do surgimento das armas de fogo, ganhava a guerra quem tinha um número maior de soldados; em algumas regiões, ainda hoje, filhos significam mais força de trabalho grátis, configurando, muitas vezes, exploração do trabalho infantil.
Por isso, até a bem pouco tempo, a exigência da capacidade procriativa autorizava a anulação do casamento. E o casamento entre pessoas do mesmo sexo era reconhecido como inexistente. Clara imposição de um único modelo de entidade familiar. Mas vã foi tentativa do legislador de impedir o reconhecimento das famílias homoafetivas, negando-lhes tutela jurídica.
Mesmo sem lei, o Judiciário, de forma corajosa, acabou por assegurar à população LGBTI – lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais, acesso ao casamento, o direito à filiação e à adoção. Nada mais do que garantir a todos os o direito à felicidade.
Agora é preciso convencer a sociedade de que toda a família merece igual respeito. Independente da orientação sexual ou identidade de gênero de seus integrantes, seja dos pais, seja dos filhos.
Foi na busca desta mudança de postura que surgiu a ABRAFH – Associação Brasileira das Famílias Homoafetivas.
É preciso cantar e decantar que toda a forma de amor vale a pena; toda forma de amor vale amar.
Afinal, todos têm direito fundamental à felicidade.
Publicado em 04/11/2005.
[1] Advogada
Sócia Fundadora nº 1 da ABRAFH
Presidenta da Comissão Nacional da Diversidade Sexual da OAB
Vice-Presidenta Nacional do IBDFAM
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