A mulher na política
Maria Berenice Dias[1]
A mulher brasileira tornou-se cidadã somente em 1932, quando adquiriu o direito de votar, e hoje o contingente feminino representa mais da metade do eleitorado. Esse número, no entanto, choca-se com o acanhado desempenho das mulheres nas urnas, mesmo vigorando desde o ano de 1995 a lei que assegura uma cota mínima de participação de cada um dos sexos nos quadros partidários.
Ainda assim, do universo político feminino, a maioria entra para a vida política pelas mãos do pai, marido ou companheiro, sendo mínimo o número de mulheres com trajetória autônoma baseada em carreiras políticas desvinculadas de laços familiares. O maior empecilho ao ingresso das mulheres na política são os próprios maridos ou companheiros, que impedem a candidatura, sob o fundamento de que elas deixariam de atender aos afazeres domésticos e de cumprir com o dever de cuidado dos filhos.
Essa quase inaptidão da mulher em participar da vida pública decorre, sem sombra de dúvida, tanto do pouco interesse dos homens em dividir o poder, como de componentes culturais que precisam ser considerados.
O ingresso da mulher no mercado de trabalho ocorreu com a revolução industrial, que buscou na mão-de-obra feminina a forma de baratear custos, e sua baixa auto-estima a fez aceitar remuneração inferior, ainda quando no desempenho da mesma função. Se tal fato a levou para fora do lar, começando a contribuir para o sustento da família, os encargos domésticos continuaram sob sua exclusiva responsabilidade.
Os relacionamentos afetivos ainda são vincados por uma marcante hierarquização, ocupando, homens e mulheres, dois mundos bem polarizados. Enquanto o homem desempenha o papel de provedor e arvora-se como chefe de família, sente-se descompromissado com as atividades domésticas. Relegada resta a mulher à função de reprodutora, responsável pela casa, pela criação dos filhos e pelo cuidado com os idosos e doentes. Reservado ao homem o espaço público, fica a mulher confinada ao recinto do lar.
Diante desse retrato, que ainda espelha a realidade de hoje, não é difícil compreender o motivo por que a mulher não busca um espaço na política.
A Constituição Federal é enfática, e até repetitiva, ao proclamar a igualdade entre o homem e a mulher, e, segundo o filósofo Norberto Bobbio, a maior transformação do século passado foi a revolução feminina.
Assim, é chegada a hora de afirmar, sem falso otimismo, que o século XXI é o século das mulheres. Mas não basta ser mulher para mudar a condição da mulher na política. É preciso que a política seja vista pela ótica da mulher. Só assim haverá uma verdadeira inovação da face da política e a participação feminina será uma conquista, não uma mera concessão.
Publicado em 23/03/2009.
[1] Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
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